...A pontuação é a respiração da frase e minha frase respira assim. E se você me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar! ...

quarta-feira, 31 de março de 2010

MULHERES CHEIAS DE GRAÇA – Padre Fábio de Melo

Do Nome infeliz à infelicidade do nome ...Ricardinho estava na igreja sentado com a mãe,Rosalva do Modesto.
Ricardinho era filho de Modesto,mas ninguém sabia quem era o tal do Modesto,porque,desde que mudou para nossa rua,Rosalva já veio sem o Modesto.Mas seu nome não mudou.Rosalva é do Modesto,mesmo a gente não sabendo onde está o Modesto. Não gosto desse negócio de falar o nome da mulher sempre acoplado ao do marido.Parece que a mulher é uma coisa pertencente,propriedade adquirida,passada em escritura.Na minha terra é tudo assim.Florípedes do compadre Hélio.Quem é esse compadre Hélio?E,se é compadre,é compadre de quem?Ninguém sabe.Só sabemos quem é Florípedes. Outro caso.Marilena do Maurício Lilico.Dizem que o tal do Lilico já morreu há mais de trinta anos,mas a Marilena não sabe dizer o nome dela sem falar do complemento já morto.Jeito esquisito de preservar a viuvez?Não sei. O mais esquisito é o caso de Maria Olívia do Murilinho verdureiro. Murilinho já morreu, a verdura já murchou, Maria Olívia já se casou com Heliofonso Pudim de Cachaça,e mesmo assim ela continua sendo chamada de Maria Olívia do Murilinho verdureiro.Ainda bem.Já imaginou trocar a verdura pelo pudim de cachaça? Coisa triste é nome feio.Outro dia eu estava na casa de Romilda Solteira e ela veio me apresentar um primo que viera da roça para um tratamento de saúde com o doutor Clemêncio E.Nogueira. Ele apontou a cara à porta e logo se apresentou estendendo a mão:- Muito prazer, sou o Gugermiro Severino da Costa. -Fiquei estarrecida como se tivesse recebido a notícia de uma tragédia. ”Nome mais triste, meu Deus”.pensei sem dizer.”Que mal fez essa criatura para merecer esse nome”,indaguei em silêncio,indignada dentro de mim.Antes fosse José.O conformismo ao ordinário seria melhor,menos doído. Nome é quase uma doença que pode fazer a pessoa sofrer a vida inteira. O duro é que para ela não há tratamentos, cirurgias, nem medicamentos. O jeito é sofrer uma agonia que se repete cada vez que alguém o solicita.Abrir crediário,informar ao telefone,marcar consulta. Tudo dói,mas nada dói tanto quanto o anúncio público em sala de espera de exame laboratorial.A enfermeira mal-humorada,com sua pranchetinha,cheia de adesivos de propaganda de remédio,chega e anuncia: -Waldergleiston Washington da Silva. O pobrezinho se levanta apressado para evitar o perigo de uma segunda chamada. Há nomes que são frutos de modismos e feitos para um único tempo da vida.Há alguns que não combinam com a velhice,mas somente com a infância.Já imaginou uma velha chamada Tatiana?Parece-me estranho.Da mesma forma como é estranho um menino recém-nascido receber o nome de Joaquim Olivério. Penso que todo mundo deveria ter o direito de mudar de nome de acordo com as etapas da existência.A menina Tatiana poderia se tornar Juliana na juventude,Maria Clara na meia-idade e Conceição no final da vida.Conceição é um nome que combina com velhice,pedra no rim,repouso,mas não combina com fraldas,berços e chupetas. O bom mesmo é possuir um nome que sobreviva a todas as fases da vida.Laura por exemplo.Laura criança, Laura moça e Laura velhinha. Laura é um nome que parece abarcar a vida inteira.Não é resumo de um tempo. A Laurinha menina,vestidinha de saias rodadas,sapatos de verniz e laço na cabeça,será no futuro a respeitosa dona Laura,professora aposentada que usará óculos e terá a pele vincada pelo tempo. Já imaginou o dilema que Shirley Patrícia vai ter quando chegar para marcar seu exame de rotina do alto dos seus 90 anos de idade?E o Mycon Patrick? Um recurso para quem tem nome feio é o apelido,a alcunha.Apelido é o apelido da alcunha.O sinônimo da expressão.É um bom jeito de melhorar um pouquinho a situação do sofredor. Ambrozina vira Zina.O apelido também é feio,mas ameniza bem.Fica carinhoso,e o carinho resgata a pessoa da feiúra do nome.A Jurênia vira Nênia,também é triste,eu sei,mas fazer o quê?Cada um melhora como pode,meu Deus! O contrário também é verdadeiro.Há nomes bonitos que estão escondidos em apelidos terríveis. Nome deveria dar cadeia.A quem escolhe,é claro! O recém-nascido está lá,quietinho,deitadinho no berço,tomando leite e fazendo cocô,enquanto a família inteira dá palpite errado no nome do pobrezinho. O pai,que gosta muito de futebol,quer que ele se chame Maradona,a mãe que é adepta do cinema internacional,quer que o nome seja Brad Pyterson,E ainda insiste que tem que ser com Y. É engraçado,mais quanto mais pobre a pessoa,maior é o número de L e Y nos nomes.A avó quer que o nome seja de 1 santo para homenagear o santo do dia.Tem também a tia esotérica que quer que seja Astrolábio,pois é um nome forte e de boas energias.O irmãozinho do bebê recém-nascido,sugere que seja Yakult.Deve ter sido o primeiro nome que veio à sua cabeça. Outra desgraça muito comum é a junção dos nomes que se faz entre os nomes dos pais.Ex: Cleide casou-se com Edvaldo.Dessa união nasceram Cleidivan,Cleidivalda,Edcleide,Cleidovaldo.... A regra é simples:Soma sílabas,subtrai letras e resulta TRAGÉDIA. Imagine se a mãe de Cleidivalda tivesse se casado com um antigo namorado,o Tibúrcio.Em vez de Cleidivalda,Cleidibúrcia.Seria o fim. * Essa semana minha amiga LITA me emprestou esse tesouro de livro,é uma leitura agradável,já é o terceiro livro que leio do PE.Fábio e cada vez mais me encanto com suas palavras,vale a pena ler.Por isso quis compartilhar aqui um trecho do livro. Por meio de contos cheios de sensibilidade, o autor adentra o universo feminino para prestar uma homenagem às "heroínas do cotidiano" - mulheres que não permitem que os problemas as dominem e sufoquem. Mulheres sempre dispostas a ajudar os mais necessitados e a se defender de quem quer subjugá-las pela força, apesar de todas as dificuldades presentes. Através da ficção, Fábio de Melo consegue emocionar o público leitor ao mesmo tempo que o leva a refletir sobre os valores humanos que jamais devem ser abandonados: a amizade, o amor, a compaixão, a coragem, a fé... ( do livro: MULHERES CHEIAS DE GRAÇA – Padre Fábio de Melo)

Um comentário:

  1. KKKKK Em minha terra Rio de Contas Ba(em plena Chapada Diamantina)também é assim...só se conhece as mulheres ou maridos,com essa nomenclatura kkkkk meros detalhes de pessoas puras e simples
    Beijos

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